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POLÍCIAS INTEGRAIS

Por • 6 Out , 2010 • Categoria: 02. OPINIÃO Print Print

Tem sido ultimamente referido, quando se pretende designar a GNR ou a PSP, o termo “Polícias Integrais”, como se esta adjectivação tivesse alguma base doutrinária ou científica, o que se afigura não corresponder à realidade. O Coronel de Infantaria da GNR, Carlos Manuel Gervásio Branco, já bem conhecido dos nossos leitores, explica porquê.policias-int-cross
A utilização do termo “integrais”, para adjectivar as Forças de Segurança, parece-nos pouco feliz e desprovido de sentido, como seguidamente procurarei explicar.
Recorrendo ao dicionário da língua portuguesa, fomos averiguar o significado da palavra “integral“e a conclusão a que chegámos foi a seguinte: “integral, adj gén. inteiro; completo; total“, o que, numa primeira leitura aplicada ao caso concreto, parece querer dizer, estarmos perante uma Polícia que detém TODAS as atribuições e competências atinentes à função policial na sua plenitude.
Ora esta situação só pode ocorrer, como facilmente se compreenderá, em países cujo modelo policial seja o monista ou por outras palavras que possuam, apenas uma polícia.
Em Portugal pelo contrário, como sabemos, vigora o modelo pluralista, aliás com suporte constitucional (nº4 do art.º 272º), com diversos corpos e serviços com funções policiais (GNR, PSP, PJ, SEF, ASAE, Polícia Marítima), pelos quais estão distribuídas diferentes atribuições e competências, o que por consequência nos levaria à partida, a afastar a qualificação de “integral”, para qualquer deles, por razões óbvias.
Contudo e mesmo numa leitura benévola, se nos quisermos ater apenas às forças de segurança (GNR e PSP), também verificamos que nenhuma delas, pode ser designada como “polícia integral”, primeiro, porque como vimos, não esgotam o modelo policial português e as suas atribuições e competências, não podem ser integrais relativamente às restantes componentes do sistema, em segundo lugar, porque uma delas, apenas funcionalmente é uma polícia, a GNR, e em terceiro lugar, porque nem mesmo entre ambas, existe total coincidência de missões e tarefas, havendo competências próprias de cada uma, como decorre necessariamente do modelo dualista, consubstanciado no principio da complementaridade.
Assim e não obstante a cada uma das forças, ter sido atribuída uma área territorial de responsabilidade, na qual exerce a generalidade das suas competências, subsistem algumas missões que independentemente da área geográfica, são desempenhadas apenas por uma, rentabilizando-se desta forma as especificidades e capacidades próprias de cada força, na decorrência dos princípios da complementaridade e do apoio mútuo, inerentes à caracterização do modelo dual.
Constituem exemplo desta afirmação, a competência própria da PSP no âmbito da segurança pessoal, de membros dos órgãos de soberania e de altas entidades ou da GNR, quanto à fiscalização e ordenamento do trânsito em toda a rede nacional fundamental e complementar.
São as diferentes naturezas, militar e civil das forças que ditam a diferenciação das missões, das áreas de responsabilidade, dos meios e dos recursos que lhes serão afectos e que diferenciará também os estatutos dos seus elementos.
Não é pois aleatória a distribuição de áreas ou de missões entre a GNR e a PSP, porque ao contrário do que a qualificação de “polícias integrais” parecia fazer crer, estamos perante dois corpos identitariamente distintos.
Se à polícia civil, deverá caber a fiscalização e o policiamento onde a concentração de pessoas é maior, nas zonas de maior densidade populacional, vulgarmente definidas como as áreas mais urbanas, já à força de natureza militar, deverão caber-lhe todas as missões que tenham conexão com questões de soberania, como sejam a vigilância de todo o território, com especial incidência nas principais vias de comunicação, nas fronteiras e nos pontos sensíveis; a segurança dos locais e edifícios de interesse estratégico, as sedes dos órgãos de soberania e representações diplomáticas no país e no estrangeiro, quando em situação de ameaça ou de risco; e subsidiariamente, a segurança das áreas de menor densidade populacional.
Contudo e não perdendo de vista o principio da complementaridade, mesmo nas áreas à responsabilidade da PSP, mantém-se em sobreposição, a presença da GNR que para além da protecção dos pontos sensíveis, deverá funcionar como 2º escalão de intervenção, quando os recursos da policia civil estiverem esgotados ou forem insuficientes, em face da intensidade da ameaça ou dos meios a utilizar, razão porque o armamento e equipamento de ambas as forças, também deverá ser em parte, diferente.
É bem verdade que nos últimos anos, muito tem sido feito no sentido de tornar a GNR e a PSP duas forças idênticas, sem cuidar de averiguar quais as verdadeiras razões das suas diferenças, a que esta designação de “polícias integrais” se veio juntar.
O desrespeito pelas diferenças entre ambas as forças e as respectivas missões, para além de subverter o modelo dualista, será gerador de conflitos e de rivalidades, onde as duplicações desnecessárias só podem gerar desperdício.

Lisboa, 6 de Outubro de 2010
Carlos Manuel Gervásio Branco
Coronel

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