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CLUBE “A LA MINUTE-FLAMINGOS”

Por • 3 Ago , 2012 • Categoria: 09. ONTEM FOI NOTÍCIA - HOJE É HISTÓRIA Print Print

Terminamos hoje uma primeira série de artigos do Coronel José Guilherme Mansilha dedicados aos primórdios do pára-quedismo desportivo. Recorda aspectos muito pouco conhecidos do pára-quedismo nacional como, entre outros, o facto de ter sido em Angola que se captou no nosso país a primeira imagem ar-ar, de um pára-quedista em queda-livre, ele próprio, sendo fotógrafo o então capitão Bragança Moutinho.

Parada do Batalhão de Caçadores Pára-quedistas N.º 21 (Belas/Luanda). Da esquerda, capitães Moutinho e Mansilha, sargentos Gaspar e Campaniço.

Parada do Batalhão de Caçadores Pára-quedistas N.º 21 (Belas/Luanda). Da esquerda, capitães Moutinho e Mansilha, sargentos Gaspar e Campaniço.

O capitão Araújo e Sá, militar de grande iniciativa, capacidade de organização e qualidades de trabalho, criou em 1965, no Batalhão de Caçadores Pára-quedistas n.º21 (BCP21), o Clube “A la minute”. Estivera em França e na Argélia, onde frequentou o curso ministrado aos pára-quedistas franceses que seguiam para esta colónia, tendo obtido o brevet de pára-quedista militar francês. A recordação desses tempos tê-lo-á influenciado na escolha do nome.
Organizou e liderou no BCP21 torneios de futebol e basquetebol entre companhias, que enchiam os tempos livres do pessoal quando em descanso em Luanda. Fundou o Boletim “Boina Verde” que, após a descolonização, passou a revista. Ainda hoje é publicada pela “Casa-Mãe” das Tropas Pára-quedistas Portuguesas em Tancos.

Primeiros 4 exemplares do "Boina Verde", em fomato e papel jornal, quinzenal, em 1965.

Primeiros 4 exemplares do "Boina Verde", em formato e papel jornal, quinzenal, em 1965.

Improvisou cadernetas individuais, onde se registavam e eram autenticados os saltos realizados no BCP21. A “jóia” para entrar no clube “A la minute” consistia na execução de uma salto em queda-livre, com retardo de um minuto (tempo em queda-livre antes de abrir o pára-quedas), sobre a parada da Unidade. Enfim, os guerreiros divertiam-se para relaxar. Os saltos, muito frequentes, foram uma oportunidade para todos melhorarem o seu comportamento e técnica no ar.
Organizou um torneio de passagem de testemunho, o primeiro “trabalho relativo” (dois ou mais pára-quedistas agarrados no ar durante a queda-livre) da maioria. Um Flamingo, em queda-livre, tinha de passar a outro um pequeno bastão de madeira. Foi um grande desafio. Não era fácil, para quem tinha tão pouca experiência. As passagens de testemunho faziam-se num curto contacto dos dois páras, encontro muito rápido sem chocarem um com o outro, em que só muita habilidade permitia a troca do testemunho. Mas a experiência foi-se ganhando e os praticantes melhorando o trabalho relativo.
Ganhou-se prática, confiança e aptidão que permitiram que os instrutores militares mais novos adquirissem, em curto tempo, uma experiência fundamental para que tivessem a capacidade de, muito em breve, transmitir os seus conhecimentos aos futuros pára-quedistas civis. Constituiu também um bom treino para os que viriam a integrar as equipas portuguesas nos campeonatos do Conselho Internacional do Desporto Militar (CISM) e torneios na Bélgica, que se seguiram.
Saltava-se de um helicóptero Alouette III que deslocava para o efeito da parada do BCP 21, sendo possível o treino de várias equipas e mesmo mais do que um salto individual por dia.
Quando um novo elemento “pagava a jóia”, seguia-se uma cerimónia de boas vindas ao novo Flamingo, reunindo os sócios presentes em Luanda no gabinete do chefe das “informações/operações” (Infs/Ops – uma das secções do estado-maior da unidade), que fazia de sede do clube.

Painel alusivo ao clube que "ornamentava" as Ops/Infs do BCP 21.

Painel alusivo ao clube que "ornamentava" as Ops/Infs do BCP 21.

Da esuqerda, capitães Lemos Costa, Araújo e Sá e Mansilha e sargento Gaspar.

Da esquerda, capitães Lemos Costa, Araújo e Sá e Mansilha e sargento Gaspar.

1.º sarg  Campaniço, ten cor Fausto Marques, cmdt do BCP21 e filho, cap Araújo e Sá e sarg Gaspar

Da esquerda: sargento Campaniço, tenente-coronel Fausto Marques (comandante do BCP21) e seu filho, capitão Araújo e Sá e sargento Gaspar.

A "emblemática" usada pelos Flamingos nas combinações de salto.

A "emblemática" usada pelos Flamingos nas combinações de salto.

Entretanto o capitão Moutinho foi colocado no BCP 21. Não aderiu ao Clube nem concordou com ele. Após a sua meritória acção de introdução da queda desportiva em Portugal, organização dos primeiros estágios de aperfeiçoamento e criação de condições para que Portugal tomasse parte nos I CISM, em França, e II no Brasil, dedicou-se ao estudo deste desporto. Ensaiou em Tancos após o II CISM, com os “desportistas” que se encontravam no Regimento de Caçadores Pára-quedistas (RCP), a aplicação prática de conhecimentos que apreendia em livros americanos. Posições de aspas e rã, máxima tracção, flecha, saída de uma vrille (rotação sobre si próprio a grande velocidade, pondo em causa a estabilidade do para-quedista), e trabalho relativo. Era um “Falcão Negro” (equipa de queda-livre do RCP) e a iniciativa não foi do seu agrado.

Mas saltava connosco, e idealizou um sistema prático para fazer fotografia aérea. Desafiou-me para um salto em que me iria fotografar no ar. Adaptando uma máquina fotográfica ao capacete, o cordão de disparo passava por dentro da manga da combinação de salto, estando o disparador ligado a um dedo que accionava o obturador. Embora eu já tivesse alguma prática de trabalho relativo, das passagens de testemunho, nunca fizera uma aproximação estável para uma fotografia.

José Guilherme Mansilha fotografado por Bragança Moutinho, a primeira foto ar-ar de um pára-quedista em queda-livre em Portugal!

José Guilherme Mansilha fotografado por Bragança Moutinho, a primeira foto ar-ar de um pára-quedista em queda-livre em Portugal!

Preaparação da aterragem em Luanda com o pára-quedas de abertura manual 6562.

Preparação da aterragem em Luanda com o pára-quedas de abertura manual 6562.

Saltámos ao mesmo tempo e tentámos a aproximar-nos, com muito pouco sucesso. A fotografia, tirada de muito longe, ficou muito fraca. Mas dá para ver que sou eu, com a combinação azul claro, dos Flamingos. Estes estavam equipados com combinações de salto azuis, verdes e brancas, mandadas fazer pelo capitão Araújo e Sá. Depois da aterragem o capitão Moutinho dizia-me: “parecias uma bailarina no ar…”. Teremos sido na verdade duas bailarinas. Foi o nosso primeiro salto em conjunto. Mas a fotografia ficou para contar a história.

No final da comissão, já em Tancos, o capitão Lemos Costa e o sargento Alfredo Serrano Rosa criaram um sistema muito mais sofisticado que permitia não só fotografar como filmar no ar. Esta invenção terá sido quase simultânea, ou mesmo posterior à do engenheiro Valter Carmelo do 1.º curso de queda livre. Fez muitas filmagens de aproximações e de estrelas (relativo) de 3 e de 4 páras.

Valter Carmelo com a máquina de filmar acoplada ao capacete.

Valter Carmelo com a máquina de filmar acoplada ao capacete.

O clube entrou em morte lenta quando o capitão Araújo e Sá se dedicou aos páras civis, aos quais deu o 2.º curso de salto de abertura automática. Desfez-se quando ele regressou à metrópole. Mas o seu trabalho teve grande mérito. Ocupou positivamente os tempos livres dos saltadores do BCP 21 e criou condições que lhes proporcionaram um bom treino e criou o Boina Verde.
O novo chefe das Infs/Ops, capitão Mansilha, dedicou os tempos livres aos páras civis, com quem os instrutores estabeleceram uma saudável relação e onde nasceram amizades que perduram até hoje.

Leia aqui outros artigos do Coronel José Guilherme Mansilha:

PIONEIROS DO PÁRA-QUEDISMO CIVIL PORTUGUÊS

II CISM – BRASIL 1965

ESTÁGIOS DE QUEDA LIVRE EM PORTUGAL

PRIMEIROS PASSOS DA QUEDA LIVRE DESPORTIVA EM PORTUGAL

DEMONSTRAÇÕES, TORNEIOS E CAMPEONATOS CIVIS DE PÁRA-QUEDISMO

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