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O CONTRA-ALMIRANTE CORTES PICCIOCHI FALA AO “OPERACIONAL”

Por • 6 Fev , 2013 • Categoria: 02. OPINIÃO Print Print

Numa altura em que se avizinham grandes mudanças nas Forças Armadas e também no Corpo de Fuzileiros da Marinha Portuguesa, o “Operacional” esteve na Base de Fuzileiros e falou com o Contra-Almirante Cortes Picciochi, comandante desta força de elite desde 2008.

O Contra-Almirante Cortes Picciochi, comanda o Corpo de Fuzileiros da Marinha desde 2008.

Ao Contra-Almirante Cortes Picciochi cabe liderar esta força de elite da Marinha Portuguesa em tempos de mudança. Também nos fuzileiros, à semelhança da generalidade da instituição militar em Portugal, as reduções de efectivos e de meios são uma realidade.

O Contra-Almirante Picciochi, 55 anos de idade e 38 de Marinha, prestou serviço a bordo de diversos navios, nomeadamente nas fragatas “Almirante Gago Coutinho”, “Comandante Sacadura Cabral” e “Comandante João Belo”. A bordo da corveta “João Coutinho” desempenhou as funções de oficial Imediato. Comandou duas unidades navais: o patrulha “Mandovi” e a corveta “António Enes”. De entre as várias funções desempenhadas em terra, salientam-se as de oficial do Estado-Maior da Armada, na Divisão de Pessoal e Organização, 2.º Comandante do Batalhão de Formação Geral Comum e Comandante do Corpo de Alunos da Escola Naval, cargo que exerceu durante 5 anos. É especializado em Educação Física e possui ainda os cursos civis de pára-quedismo e de treinador de voleibol.
Recebeu-nos no seu austero gabinete de trabalho no Alfeite no passado dia 5 de Fevereiro de 2013, e concedeu-nos a entrevista que se segue, a qual muito agradecemos e certamente permitirá aos nossos leitores um maior conhecimento da realidade actual dos nossos fuzileiros. Agora pela voz do seu comandante e na sequência com reportagens, esperamos deixar aqui no “Operacional” um retrato tão factual quanto possível das várias componentes e missões do Corpo de Fuzileiros da Marinha Portuguesa.

Ao fundo o edificio de comando da Base de Fuzileiros e em primeiro plano uma Lancha de Desembarque Média, «Homenagem da Marinha a todos os marinheiros que em África (1961-1974) serviram nas lanchas de desembarque... ...em condições particularmente dificeis, o que muito honrou a Armada e o País»  -

Ao fundo o edifício de comando do Corpo de Fuzileiros/ Base de Fuzileiros e em primeiro plano uma Lancha de Desembarque Média, «Homenagem da Marinha a todos os marinheiros que em África (1961-1974) serviram nas lanchas de desembarque… …em condições particularmente difíceis, o que muito honrou a Armada e o País»

O Comando do Corpo de Fuzileiros está instalado na Base de Fuzileiros a qual por sua vez se localiza no interior da base Naval de Lisboa no Alfeite.

O Comando do Corpo de Fuzileiros está instalado na Base de Fuzileiros a qual por sua vez se localiza no interior da Base Naval de Lisboa no Alfeite.

O "Operacional" foi recebido pelo Contra-Almirante Picchioci no passado dia 5 de Fevereiro de 2013.

O “Operacional” foi recebido pelo Contra-Almirante Picciochi no passado dia 5 de Fevereiro de 2013.

Operacional: O que será em termos de organização e efectivos, o Corpo de Fuzileiros da Marinha Portuguesa em 2013?
Contra-Almirante Picciochi: O Corpo de Fuzileiros tem-se adaptado, ao longo dos tempos, às contingências resultantes das reduções de pessoal, mantendo a sua capacidade de cumprir as missões que lhe são atribuídas. No presente, encontra-se em estudo uma nova reestruturação, com quantitativos ainda não completamente definidos, mas que por certo não irá comprometer a essência das unidades operacionais.

A organização actual do Corpo de Fuzileiros remonta a 1994, tendo no entanto sido criadas algumas valências, "residentes" nos dois batalhões: Pelotão de Abordagem; Destacamento de Cooperação Civil-Militar; Destacamento de Informações.

A organização actual do Corpo de Fuzileiros remonta a 1994, tendo no entanto sido criadas algumas valências, “residentes” nos dois batalhões: Pelotão de Abordagem; Destacamento de Cooperação Civil-Militar; Destacamento de Informações.

Estandartes Heráldicos das unidades do Corpo de Fuzileiros. Tudo indica que a breve trecho as restrições orçamentais também aqui  deixarão a sua marca.

Estandartes Heráldicos das actuais sub-unidades do Corpo de Fuzileiros. Tudo indica que a breve trecho as restrições orçamentais também aqui deixarão a sua marca.

Op. E como está o Corpo em termos de efectivos?
CAlm: Estamos a trabalhar abaixo do previsto no quadro orgânico, devíamos ter cerca de 2.000 militares e funcionamos com 1.600, nem todos fuzileiros, o que significa como calculará um esforço acrescido por parte do nosso pessoal.

Op: Quais são os empenhamentos actuais do Corpo de Fuzileiros (CF) em território nacional e no estrangeiro?
CAlm: No território nacional está cometido ao Corpo de Fuzileiros um vasto e diversificado conjunto de atividades, de que saliento, entre outras, a manutenção em permanência de uma companhia com prontidão de 48 horas para integração na Força Nacional de Reação Imediata, recentemente empregue no âmbito da Operação Manatim, equipas embarcadas nos navios de maior porte atribuídos ao dispositivo naval do Continente e Açores, para além de um vasto conjunto de militares empenhados em tarefas de segurança a instalações militares e, ainda, na época balnear, em reforço dos órgãos da Autoridade Marítima na assistência a banhistas em áreas não vigiadas. De salientar, também, a prontidão material e pessoal para apoio à Autoridade Nacional de Proteção Civil, no âmbito da participação pré-estabelecida em vários planos de emergência, nomeadamente em situações de cheias e prevenção de incêndios florestais.
No estrangeiro os fuzileiros têm estado empenhados em diversos projetos de cooperação técnico-militar nos países africanos de expressão portuguesa e em Timor-Leste, bem como têm mantido uma presença continuada em operações internacionais conduzidas sob a égide da NATO, da EU e da ONU, tendo presentemente militares seus no Afeganistão e no Kosovo e outros em preparação para embarque no navio português que comandará a operação de repressão da pirataria no oceano Índico.
Para quem gosta de estatística, posso dizer-lhe que efectuamos 3.800 missões por ano o que representa, em média, 10 por dia, 365 dias por ano.

O Comandante do Corpo de Fuzileiros acompanha com atenção a acção dos seus militares no Afeganistão. Aqui com a guarnição da viatura em que ali viajou (em 2009) durante uma das vistas ao teatro de operações.

O Comandante do Corpo de Fuzileiros acompanha com atenção a acção dos seus militares no Afeganistão. Aqui com a guarnição da viatura em que ali viajou (em 2009) durante uma das vistas ao teatro de operações.

Fuzileiro do 5.º Contingente Nacional no Afeagnistão, durante a fase de preperação da força em Beja (2012). Oficiais, saregentos e praças fuzieliros têm servido neste teatro de operações nos últimos anos, em diversos cargos e funções, estando actualmente o seu maior número atribuido a missões de "protecção da força".

Fuzileiro do 5.º Contingente Nacional no Afeganistão, durante a fase de preparação da força em Beja (2012). Oficiais, sargentos e praças fuzileiros têm servido neste teatro de operações nos últimos anos, em diversos cargos e funções, estando actualmente o seu maior número atribuído a missões de “protecção da força”.

Op: Em tempos companhias de fuzileiros serviram na Bósnia e em Timor, no entanto tal nunca aconteceu no Kosovo, onde actualmente mantemos pouco mais do que uma companhia. Alguma foi vez foi equacionada a participação dos fuzileiros neste teatro de operações?
CAlm: O Corpo de Fuzileiros tem como um dos seus lemas “no mar e em terra quando e onde necessário”. A decisão do seu emprego é uma competência que não está cometida ao Comando do Corpo de Fuzileiros, pelo que apenas posso afirmar que os fuzileiros estão sempre prontos, para atuar onde superiormente for decidido que a sua contribuição seja necessária.

Op: O CF mantém alguma cooperação bilateral com forças estrangeiras congéneres?

CAlm: Têm sido mantidos contatos regulares com diversas forças congéneres, designadamente da Alemanha, Argélia, Brasil, Espanha, Estados Unidos, França e Polónia (*), seja em matéria de treino combinado seja no campo da formação. Algumas destas cooperações são específicas do Destacamento de Acções Especiais e também temos outras que chamamos “de oportunidade”, o que aconteceu por exemplo com França. Esteve cá um navio de assalto anfíbio deste país e nós aproveitamos para realizar operações a partir desse meio naval que não temos.

Op: Como está o CF em termos de equipamentos, nomeadamente os individuais, mas também aqueles que permitem o seu emprego característico, o desembarque?
CAlm: Como qualquer outra força militar, gostaríamos de poder estar sempre na linha da frente do equipamento militar, no entanto, até porque estamos cientes das dificuldades financeiras nacionais, não será a falta de meios ou equipamento que impedirá o cumprimento de qualquer missão cometida aos fuzileiros.

Uma vaga de botes aproxima-se da Praia Formosa na Ilha de Santa Maria/Açores no decurso de um exercicio dos três ramos das Forças Armadas. A geografia portuguesa aconselha a manutenção da componente anfibia.

Uma vaga de botes aproxima-se da Praia Formosa na Ilha de Santa Maria/Açores no decurso de um exercício dos três ramos das Forças Armadas. A geografia portuguesa aconselha à manutenção e desenvolvimento da componente anfíbia e dos seus meios.

Exercicio anfibio na costa continental (Pinheiro da Cruz). Em primeiro plano uma Lancha Anfíbia de Reabastecimento e Carga (LARC) que reabastece as forças desembarcadas a partir dos navios aos largo.

Exercício anfíbio na costa continental (Pinheiro da Cruz). Em primeiro plano uma Lancha Anfíbia de Reabastecimento e Carga (LARC) que reabastece as forças desembarcadas a partir dos navios ao largo.

A espingarda automática e outro armamento e equipamento individual está, também nos fuzileiros, dependente de um malfadado programa sempre adiado ou cancelado.

A espingarda automática e outro armamento e equipamento individual está, também nos fuzileiros, dependente de um malfadado programa sempre adiado ou cancelado.

Esta foto tem mais de uma década, mas neste caso, as equipas de abordagem, fruto das missões internacionais, estão agora melhor equipadas e armadas.

Esta foto tem mais de uma década, mas neste caso, as equipas de abordagem, fruto das missões internacionais, estão agora melhor equipadas e armadas.

Op: E armamento?
CAlm: Até à decisão sobre o processo de aquisição de uma nova arma ligeira para equipar as Forças Armadas, continuaremos com a espingarda automática G3, a qual, apesar da idade e menor flexibilidade em cotejo com armas mais recentes, tem correspondido minimamente às necessidades.

Op: As missões no Afeganistão e no Índico têm permitido algum reequipamento do Corpo de Fuzileiros? Em que medida?
CAlm: Permitiu a aquisição pontual de algum material dedicado ao Pelotão de Abordagem para as missões que cumpre no Índico. Desde 2009 equipas deste pelotão têm embarcado todos os anos nos navios da Marinha que ali cumprem missões de combate à pirataria integrados em forças multinacionais.

Op: Apesar das restrições orçamentais há programas de reequipamento em curso?
CAlm:Os programas mais ambiciosos de reequipamento a nível da LPM têm vindo a ser adiados por indisponibilidade financeira, pelo que apenas tem sido possível a aquisição de algum equipamento individual para substituição do que entretanto se degradou com o uso.

Op: Que impacto teve na organização do CF o cancelamento das encomendas de viaturas blindadas Pandur?
CAlm: A aquisição de viaturas blindadas anfíbias é uma ambição do Corpo de Fuzileiros desde longa data, pela mobilidade e proteção blindada que conferem em qualquer situação, muito especialmente em operações de projeção anfíbia. A existência desta capacidade é indissociável do projeto de aquisição de um Navio Polivalente Logístico, o qual continua a constituir um desiderato ambicionado pelas Forças Armadas.

A Escola de Fuzileiros em Vale de Zebro.

A Escola de Fuzileiros em Vale de Zebro, “Casa-Mãe” dos fuzileiros portugueses. “Em 3 de Junho de 1961 foi criada a Escola de Fuzileiros por iniciativa e impulso de um carismático chefe militar que foi o almirante Armando de Reboredo e Silva, a quem se deve a recriação dos Fuzileiros na Armada”.

Os fuzileiros prestam homenagem a um dos seus heróis, sem dúvida aquele que granjeou maior destque público fruto das suas acções em África e ao modo como sempre as divulgou, Comandante Guilherme de Alpoim Galvão.

Os fuzileiros prestam homenagem a um dos seus heróis na última guerra que Portugal travou em África, sem dúvida aquele que granjeou maior destaque público fruto das suas acções em combate e ao modo como sempre as assumiu e divulgou: Comandante Guilherme Almor de Alpoim Galvão.

Op: Como decorre hoje a formação de um fuzileiro?
CAlm: A formação dos fuzileiros tem vindo a adaptar-se às necessidades e exigências do presente, seja pela revisão da matéria curricular em virtude do aumento de escolaridade, seja pela atualização de novos métodos de operação adaptados às caraterísticas da conflitualidade prevalecente, sem contudo perder as bases formativas que conferem valências singulares, específicas dos fuzileiros. No seu conjunto, a formação de um fuzileiro, para além dos da componente básica da recruta, compreende 162 dias úteis de curso, onde se inclui a participação em 18 exercícios, e 8 dias úteis de estágio em unidades operacionais.
Na Escola de Fuzileiros em Vale de Zebro ministramos a formação militar básica a todas as praças da Marinha (sejam destinados a fuzileiros ou não) e aos oficiais contratados destinados a fuzileiros.

Op: Porque não têm os fuzileiros elementos do sexo feminino?
CAlm: Os concursos são abertos a ambos os sexos. A razão pela qual não existem elementos do sexo feminino deve-se ao fato de nenhuma candidata ter, até à data, logrado passar nas provas de admissão ao curso.

Op: Qual o grau de colaboração que o Corpo de Fuzileiros tem com unidades de outros ramos das Forças Armadas?
CAlm: Existe uma colaboração total com os outros ramos das Forças Armadas, quer em termos de exercícios conjuntos, quer na rentabilização de meios e infraestruturas, o que, para além das aprendizagens mutuas que desta forma se conseguem, tem permitido minimizar os impactos das restrições orçamentais.

O comandante do Corpo de Fuzileiros acompanha um exercicio de desembarque abordo de um LARC.

O comandante do Corpo de Fuzileiros acompanha um exercício de desembarque abordo de um LARC.

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Fuzileiro de Moçambique formado com o apoio da Cooperação Técnico-Militar Portuguesa. Também Angola, Guiné-Bissau, Timor-Leste e Cabo Verde, têm ou tiveram assessoria dos fuzileiros portugueses para formar e manter as suas unidades deste tipo.

Exercicio Fekino em Angola. Elemento do DAE (de costas) no decurso de exercicio de tiro com armamento deste destacamento.

Exercício Felino em Angola. Militar angolano efectua tiro com armamento do Destacamento de Acções Especiais, sob supervisão de um sargento desde destacamento.

O DAE em exercicio no Tejo com a Esquadrilha de Helicópteros da Marinha. Estes meios (e outros, quer da Marinha quer da Força Aérea) têm sido empregues todos os anos em operações anti-droga com inegável sucesso.

O DAE em exercício no Tejo com a Esquadrilha de Helicópteros da Marinha. Estes meios (e outros, quer da Marinha quer da Força Aérea) têm sido empregues todos os anos em operações anti-droga com inegável sucesso.

Op: No âmbito das forças especiais como decorre a colaboração com o Quartel-General de Operações Especiais do EMGFA?
CAlm: A colaboração é normal no âmbito das atribuições e responsabilidades de cada um. Temos colaborado com o QGOE sempre que requerido, apontando-se, como exemplo disso, os contributos dados no âmbito da ativação da componente de Ops especiais.

Op: O que nos pode dizer sobre a colaboração do CF, nomeadamente do DAE, com as autoridades policiais no combate ao tráfico de droga em Portugal?
CAlm: O combate ao narcotráfico é efetuado pelas autoridades policiais que, ocasionalmente, a seu pedido, solicitam o nosso apoio na execução de algumas operações próprias. Nos últimos 5 anos efectuamos uma dúzia de operações neste âmbito.

 

 

 

 

 


O Corpo de Fuzileiros tem como um dos seus lemas "no mar e em terra quando e onde necessário". Assim foi no passado nas campanhas de África, assim é hoje com as missões no Afeganistão e no Índico, ou nos mares da Guiné-Bissau. Assim será no futuro, garante o Contra-Almirante Picchioci, os fuzileiros de hoje estão à altura dos seus antepassados.

(*) As principais unidades são:
Polónia-JW Formoza – Jednostka Wojkowa Formoza, integrado no Wojska Specjalne Rzeczypospolitej Polskiej

 

Alemanha-Kampfschwimmer, integrado no KSK Kommando Spezialkräfte em 1997

 

Espanha-Infanteria de Mariña – BRIMAR; Unidad de Operaciones Especiales (UOE) integrado na Fuerza de Guerra Naval Especial

 

Macau-Corpo de Polícia de Segurança Pública de Macau –

 

EUA-USMC; Navy SEAL’s; Special Forces

 

Reino Unido-Royal Marines

 


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