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 O QUE É UMA “MISSÃO DE PAZ E HUMANITÁRIA”?

Por • 18 Nov , 2016 • Categoria: 02. OPINIÃO Print Print

Em Portugal temos tendência para complicar coisas simples e a resposta a esta pergunta em título pode ter várias interpretações, com consequências legais muito diferentes.

O NRP Figueira da Foz (na imagem o Viana do Castelo da mesma classe) está neste momento no Mediterrâneo Central empenhado na Operação Triton da Agência Europeia de Fronteiras.

O NRP Figueira da Foz (na imagem o Viana do Castelo da mesma classe) está neste momento no Mediterrâneo Central empenhado na Operação Triton da Agência Europeia de Fronteiras.

O “Correio da Manhã” em 05 de Novembro e depois o “Diário de Noticias” em 06 e 07 de Novembro deram conta da situação que se verifica com a não atribuição da designação em causa, “paz e humanitária”, à missão que um navio de guerra da Marinha Portuguesa desempenha no Mediterrâneo, socorrendo emigrantes/refugiados que tentam alcançar a Europa. Ao DN o Ministério da Defesa Nacional refere «…Os militares a bordo do navio Figueira da Foz estão a desempenhar “uma missão civil” de apoio ao SEF e à agência europeia Frontex, no Mediterrâneo, pelo que não são considerados Força Nacional Destacada (FND)…».

O objectivo desta nova classificação, “missão civil”, sem qualquer base jurídica ou doutrinária, só poderá ser o de não assumir os custos financeiros que a aplicação da legislação acarreta. Basicamente o Decreto-Lei n.º 233/96 de 7 de Dezembro –  o “estatuto dos militares das Forças Armadas envolvidos em missões humanitárias e de paz fora do território nacional, no quadro dos compromissos internacionais assumidos por Portugal” – e o n.º 348/99 de 27 de Agosto – seguro de vida, invalidez permanente.

Da leitura do referido DL n.º233/96 é fácil concluir que a missão em causa se pode enquadrar naquilo que o legislador considerou, nesse ano de 1996, “de paz e humanitárias”, numa clara intenção de abranger todas as missões então conhecidas: «…a defesa dos nossos interesses passa pela participação… …nas acções de defesa e promoção da paz no mundo, assumindo por inteiro as responsabilidades que nos cabem nas organizações internacionais e alianças político-militares em que estamos inseridos… …militares portugueses ou forças militares constituídas podem, em tempo de paz, ser chamados a desempenhar missões de carácter militar com objectivos humanitários…»

Note-se que o legislador, no respeitante ao Suplemento de Missão, até teve o cuidado de deixar escrito que, quando este for atribuído, não é passível de ser acumulado com o Suplemento de Embarque, recebendo naturalmente o militar apenas o que é de valor mais elevado (Art.º 3.º , n.º 6, DL 233/66). Este é apenas um aspecto, o que foi realçado na imprensa, mas na realidade há vários outras disposições legais que tornam muito diferente uma missão ao abrigo da legislação específica para as missões de paz e humanitárias das realizadas fora deste âmbito.  

Para isso, para acabar de vez com vários problemas que aconteceram nos anos 90, primeiro com os observadores militares e depois nos primeiros contingentes a rumar a África (1993/1994) e também no inicio da missão na Bósnia em 1996, para isso se produziu esta legislação especifica que foi sendo aperfeiçoada e melhorada ao longo dos anos.

E quem decide então o que é uma missão de paz e humanitária? O Decreto de 1996 responde: «…Decidida, nos termos da Constituição e da lei, a participação de Portugal numa missão humanitária ou de paz, compete ao Ministro da Defesa Nacional, por portaria, definir os termos dessa participação e cometer às Forças Armadas a missão ou missões daí decorrentes…».

No caso em apreço, o ministro da tutela decidiu não considerar esta missão com carácter de paz ou humanitário, sendo assim uma missão da Marinha como qualquer outra na nossa costa, sem custos acrescidos com o pessoal, mesmo que o navio esteja bem longe das nossas águas territoriais por cerca de dois meses, “à ordem” de uma organização internacional a que pertencemos, se destine a socorrer pessoas em perigo e até do Estado-Maior General das Forças Armadas considerar na sua comunicação pública esta como qualquer outra FND.

Acresce a toda esta situação que os inspectores do SEF embarcados, recebem “ajudas de custo no estrangeiro”, o que a serem certas as notícias publicadas na imprensa, representam um valor 4 a 5 vezes superior ao do suplemento de embarque auferido pelos militares que operam o navio. 

Particularidades da nossa politica de defesa – fazer mais com menos – que só alguns malabarismos legais e mediáticos conseguem explicar.

A Área de Operações do Mediterrâneo Central e o "sector" onde o NRP Figueira da Foz tem cumprido a sua missão.

A Área de Operações do Mediterrâneo Central e o “sector” onde o NRP Figueira da Foz tem cumprido a sua missão.

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