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NAULILA – SUL DE ANGOLA, 18 DE DEZEMBRO DE 1914

Por • 24 Jan , 2012 • Categoria: 05. PORTUGAL EM GUERRA - SÉCULO XX Print Print

Voltamos hoje ao tema 1.ª Guerra Mundial e mais uma vez através do trabalho de investigação de Manuel Ribeiro Rodrigues. Naulila, Sul de Angola, 18 de Dezembro de 1914, – é aqui revisitado pela voz de quem viveu esses dramáticos acontecimentos.

Formatura no Lubango, antes de partirem ao encontro dos alemães

Formatura no Lubango, antes de partirem ao encontro dos alemães

Renovamos os nossos agradecimentos a Manuel Ribeiro Rodrigues e ao trabalho que vem levando a cabo no seu Blogue “Grande Guerra 1914-1918”.


«Poder-se-á resumir assim o combate de Naulila conforme o testemunho do Tenente Ernesto Moreira dos Santos:

(…) Ouviu-se um nervoso toque de alarme. Logo de seguida soube-se que uma força dos nossos postos avançados tinham retirado do flanco esquerdo. Simultâneamente irrompe um nutrido fogo de artilharia no nossos flanco esquerdo, surpreendendo-nos. A seguir, rajadas de metralhadora cuspiam pelo espaço as suas mortíferas balas. Começámos a ver rastejando a infantaria inimiga à qual o sol batendo-nos me cheio nos olhos, não deixa fazer a pontaria; mal se divisam vultos indistintos, aparecendo e desaparecendo nos claros das ondulações do terreno. O tiroteio aumentava num crescer diabólico. O comandante de pelotão dá ordens a uma meia dúzia de homens do flanco esquerdo para dirigirem o seu fogo naquela direcção. O comandante de companhia, Capitão Homem Ribeiro, de binóculo em punho, diligente, de um lado para o outro, procura regular o tiro, animando, encorajando, valente e intemerato…foi o primeiro a cair morto (…)

Dispositivo das forças pelas 12 horas de 17 de Dezembro

Dispositivo das forças pelas 12 horas de 17 de Dezembro

 (…) Os artilheiros alemães com uma peça que tinham feito avançar, mascarada com uma viatura da Cruz Vermelha, contra todos os regulamentos de Haia, flagela-nos de surpresa, com tiros de lanterneta, enfiando-nos a trincheira. Ao 6.º tiro da artilharia alemã, rompe o incêndio nas palhotas do Posto, que serviam de paiol a milhares de cartuchos para todas as bocas de fogo. Os cunhetes das munições de infantaria e os cofres das munições da artilharia, com o calor do incêndio, rebentavam e as suas balas caíam em cima dos defensores da trincheira. Era um horror! (…)

(…) Nós, no Posto, éramos infelizes em tudo e desafortunados sob vários aspectos. Perto das oito horas, depois de um terrível tiroteio de fogo vivo, algumas armas disparavam-se por si, devido ao aquecimento. O tiro partia imediatamente logo que se fechava a culatra. Houve bastantes ferimentos nos dedos, por queimaduras.(…)

Dragões de Angola

Dragões de Angola

(…)Às oito horas e quinze minutos, ouve-se na retaguarda do inimigo, que se encontra a escassos metros de nós, um alarido surdo, seguindo-se um enfraquecimento do fogo das metralhadoras inimigas. Um punhado dos nossos Dragões* com cavalos chagados e esqueléticos, conseguiu dar uma carga, num terreno coberto de espinheiros, cujos bicos, são chamados de unhas de gato, lançando o pânico nas fileiras adversas, conseguindo baixar nas guarnições de duas peças de artilharia (…)

A marcha das forças alemãs para o combate, em 17/18 de Dezembro

A marcha das forças alemãs para o combate, em 17/18 de Dezembro. Movimento e acção do Esquadrão de Dragões.

 (…) Foi tão eficaz esta carga, por meia dúzia de homens, destacando-se o Tenente Aragão, o Alferes Serrano entre outros, feita à retaguarda do flanco da posição da artilharia inimiga, que os surpreendeu, rolando alguns desses artilheiros pelo chão, destroçados (…)

A chegada ao Lubango do resto do 1.º Esquadrão de Dragões que tão corajosamente atacou os alemães em 18 de Dezembro de 1914. À frente o Comandante Tenente Artur Matias

A chegada ao Lubango do resto do 1.º Esquadrão de Dragões que tão corajosamente atacou os alemães em 18 de Dezembro de 1914. À frente o Comandante Tenente Artur Matias

(…) Desta carga e desde o local da artilharia inimiga até ao nossos Postos, caíram quase todos os cavaleiros e cavalos, mortos ou feridos, pelas metralhadoras alemãs, voltadas em massa contra eles (…) Só quem presenciou pode avaliar tamanha ousadia e ânsia em salvar a Infantaria e em honrar as nobres tradições da Cavalaria (…) Tratava-se do 1.º Esquadrão de Dragões de Angola, comandados pelo valoroso Tenente Aragão.

Metralhadoras e a 10ª Companhia de Landins na face direita

Metralhadoras e a 10ª Companhia de Landins na face direita

Regressando ao testemunho do Tenente Ernesto Moreira dos Santos: (…) Aquando da carga dos Dragões, recebeu-se uma ordem rápida, nervosa, quase uma sentença de morte: o Comandante do pelotão, Tenente Marques, vendo as nossas munições a dizimarem os seus soldados devido ao incêndio do paiol, manda armar baioneta, ordem que é transmitida de homem a homem e a um dado sinal, saltou-se a trincheira e num marche, marche inigualável, quase inacreditável, aos gritos de: “avança…avança…” como naquele tempo se faziam as cargas, se avançou numa corrida fulgurante, contra o inimigo, quase contra a morte, uns 50 a 60 metros, para nos determos próximo de um imbondeiro, derrubados pela artilharia alemã (…)


Soldados alemães

Soldados alemães

(…) Caíram muitos, é certo, mas naquele arranco até o inimigo ficou surpreso. Tendo passado para a história a frase do Comandante do meu pelotão: ” Antes morrer pelas balas do inimigo, do que pelas nossas!” Tratava-se do pelotão do Tenente Marques da 12.ª Companhia de Infantaria N.º 14.

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(…) Foi pena a falta de reforços naquele momento. Bastava mais um pelotão para se prosseguir naquele avanço e nenhum alemão voltaria à Damara (…)

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(…) Só às nove horas menos um quarto os alemães ocuparam o Posto. O comandante de pelotão ainda combatia, agarrado a uma arma. Foi o último a entregá-la, depois do assalto da infantaria alemã, numa carga impetuosa e cerrada. Eu jazia no chão, com a perna direita ferida por um estilhaço de granada, o ante-braço esquerdo furado por uma baioneta, o parietal direito ferido e o maxilar inferior partido (…)

Grupo de oficiais que combateram em Naulila. Sentados da direita para a esquerda: Capitães Reis e Patacho, Tenente Sabo e Alferes Menezes. De pé, também da di- reita para a esquerda, Tenente Stockler, Alferes Veterinário Abade, Tenente Bettencourt e Tenente Matias

Grupo de oficiais que combateram em Naulila. Sentados da direita para a esquerda: Capitães Reis e Patacho, Tenente Sabo e Alferes Menezes. De pé, também da di- reita para a esquerda, Tenente Stockler, Alferes Veterinário Abade, Tenente Bettencourt e Tenente Matias

(…) Tinha sido cumprida a nossa missão: RESISTIR ATÉ AO SACRIFÍCIO! Para que as forças dos Morros de Caluéque, pudessem retirar para o Norte (…)

(…) Foi assim que se bateram em Naulila os soldados portugueses em baptismo de fogo, o primeiro combate de que reza a história de Portugal que se travou contra soldados alemães (…)

Grupo de Sargentos que estiveram em Naulila

Grupo de Sargentos que estiveram em Naulila

(…) Mesmo assim, eu pergunto: Venceram os alemães em Naulila? Não! Venceram os portugueses? Não! Foi um combate indeciso… mas para os portugueses, foi mais honroso. Os alemães tinham o comandamento do terreno; o quíntuplo do efectivo; armamento moderníssimo (1912). Nós o de 1904! (…)

MORTOS E FERIDOS EM NAULILA

Mortos
3 oficiais, 54 praças europeias e 12 indígenas

Feridos
5 oficiais, 61 praças europeias e 10 indígenas

Prisioneiros
3 oficiais e 34 praças europeias

Enforcados
Todos os soldados indígenas LANDINS, que os alemães aprisionaram e depois executaram

Ernesto Moreira dos Santos
“Cobiça de Angola”

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Homenagem prestada ao heróico Comandante do 1.º Esquadrão dos Dragões de Angola Tenente Francisco Xavier da Cunha Aragão que se destacou na carga de Naulila.»

* Os uniformes, armamento e equipamento das tropas ultramarinas e das indígenas será um assunto a tratar oportunamente.

Coordenação do texto e ilustrações: Manuel Ribeiro Rodrigues

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