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DEFESA NACIONAL E FORÇAS ARMADAS, O PIOR E O MELHOR DE 2017

Foi um ano fértil em acontecimentos marcantes na área da Defesa Nacional e Forças Armadas, quer aspectos positivos como o fortíssimo empenhamento para ajudar a colmatar as graves limitações evidenciadas pelo sistema de protecção civil nacional e o comportamento operacional dos militares portugueses República Centro Africana; quer negativos como os acontecimentos ainda não totalmente esclarecidos dos Paióis Nacionais de Tancos e o comportamento subsequente de agentes militares e políticos.

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A participação dos Comandos da Brigada de Reacção Rápida na Missão ONU na República Centro Africana, onde juntamente com outros militares do Exército e da Força Aérea tiveram – e estão a ter – um comportamento operacional de excelência, são para nós o facto positivo do ano. Os militares portugueses, poucos mas bons, não conseguem por si só resolver os tremendos problemas da RCA mas destacaram-se pela sua competência e profissionalismo no seio da força multinacional. Foram úteis, salvaram muitas vidas e prestigiaram as Forças Armadas Portuguesas e o país.

Tentando fazer uma síntese dos acontecimentos de 2017 seleccionamos alguns aspectos que julgamos merecem destaque, começando pelas limitações seguindo depois para os aspectos positivos que nos dão esperança em dias melhores neste 2018!

Limitações persistentes

As Forças Armadas Portuguesas estão há anos a enfrentar dificuldades quer em termos orçamentais quer com uma continuada falta de recursos humanos e ainda não foi em 2017 que a situação se inverteu, situação mais difícil no Exército. Nem estabilizou, as unidades vivem com tremenda falta de dinheiro para a gestão corrente e para o treino operacional, os exemplos concretos que nos chegam são muitos e apenas as forças em preparação para missões expedicionárias – umas centenas de homens/ano – são poupadas a este garrote.

A nível dos efectivos não se conheceram em 2017 medidas legislativas que permitissem aumentar o recrutamento, apenas algum incremento da publicidade o que naturalmente sendo necessário e importante não consegue resolver o problema de fundo como se tem provado em anos sucessivos. O assunto não é de hoje mas piora ano após ano. Nas unidades sabe-se bem o que são as condições de vida dos militares na actualidade, quer os profissionais quer os contratados, e sabe-se bem as razões porque os soldados – e aqui é que reside o problema principal – não querem ficar nas fileiras. E, não menos importante, o que será a vida de um ex-militar contratado quando regressa à vida civil. Não vale a pena tentar inventar desculpas esfarrapadas nem sacudir responsabilidades políticas. Política foi a decisão de terminar com o serviço obrigatório, política terá que ser a solução. E essa tem a ver com aquilo que se oferece aos jovens num mercado liberalizado – e agora com o emprego a crescer – para servirem nas Forças Armadas. 

Este aspecto ganha gravidade acrescida nas forças especiais (pára-quedistas, fuzileiros, comandos, operações especiais), aquelas que deveriam estar com os efectivos orgânicos mais próximos dos 100% por serem as que maior grau de prontidão têm que ter, ou seja, existem para serem empregues com tempos de reacção muito curtos. Esta situação, por exemplo nos Comandos, até teve reflexos no adiamento da partida da força expedicionária para a RCA em meados deste ano, facto que nunca tinha acontecido(***); e no malfadado caso dos Paióis, não desculpando falhas graves no planeamento e conduta da segurança, a realidade é que o pano de fundo da redução significativa da segurança foram as tremendas limitações em pessoal na unidade que originalmente tinha a segurança a seu cargo e levou ao “nascimento” do sistema que acabou por falhar.

Algumas unidades tem recebido nos últimos anos (desde 2013) um número muito limitado de armas novas, como esta HK G-28 na Força Aérea (e também há alguns exemplares das Operações Especiais do Exército). Ao contrário as unidades empenhadas em missões exteriores – salvo pequenos destacamentos de operações especiais – continuam com a veterana HK G-3, mesmo que em alguns casos estas tenham recebidos acessórios para tentar colmatar parte das suas limitações operacionais, a espingarda está ultrapassada.

As aquisições de equipamento e armamento foram praticamente nulas(*), apenas alguns artigos, muito poucos, adquiridos em urgência para as Forças Nacionais Destacadas, bem menos do que os necessários. Os programas que há muito urgem continuam a “marcar passo”. Estamos na RCA há um ano e as forças em campanha não receberam uma única viatura blindada nova; vamos enviar uma força para o Afeganistão – teatro de operações com exigências tecnológicas diferentes da RCA – e, que se saiba, não receberá um único MRAP – Mine-Resistant Ambush Protected. Portugal é certamente o único país da NATO que emprega forças no Afeganistão (e outros teatros) sem dispor de um único veículo destes. Continuamos com a HK G-3 de 1961 e a Galil de 1980, a nova arma está anunciada, veremos se será em 2018 que pelo menos as unidades expedicionárias recebem armamento moderno. Os raríssimos drones distribuídos têm tido um desempenho no mínimo discutível.

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A espingarda automática HK G-3, calibre 7,62mm foi introduzida em Portugal no ano de 1961 e ainda hoje é a arma usada pela maioria dos militares do Exército nas missões exteriores, do Iraque à RCA e certamente ainda será novamente usada no Afeganistão. Parece incrível como ainda não foi possível, pelo menos para as unidades expedicionárias que significam umas escassas centenas de militares, resolver esta limitação operacional.

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Os MRAP – Mine Resistant Ambush Protected – foram uma das respostas às necessidades de protecção das tropas no Iraque e Afeganistão, hoje estão vulgarizados nos países que operam nesses teatros de operações.

Missões internacionais cumpridas com profissionalismo

A participação portuguesa nas missões da NATO, ONU e UE significa sem dúvida – a par com o empenhamento no apoio em território nacional ao sistema de protecção civil – aquilo que de melhor os militares puderam fazer durante 2017.

Os efectivos são modestos, nada que se compare com décadas anteriores, mas têm cumprido bem! Para se ter uma noção do nível de empenhamento actual recorda-se a título de exemplo, quando começamos a missão da NATO da Bósnia em 1996 ou da ONU em Timor-Leste em 2000, fizemo-lo com unidades de escalão batalhão reforçado e efectivos a rondar os 1.000, em 2017 começamos a missão da ONU na RCA com 160 militares e na NATO, ao contrário, até retiramos os 170 efectivos que mantínhamos no Kosovo numa missão de longa duração e em contrapartida empenhamos 140 militares na missão desta mesma NATO na Lituânia, mas apenas durante 4 meses. Na NATO em 2018 iremos voltar com uma unidade escalão companhia ao Afeganistão, e à Lituânia voltaremos para uma missão de 4 meses também com uma unidade de escalão companhia – do Corpo de Fuzileiros que inexplicavelmente têm estado arredados de muitas missões expedicionárias – ou seja, sempre menos de 200 militares. 

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A participação portuguesa na missão da NATO no Kosovo, iniciada em 1999 com um batalhão foi praticamente interrompida entre 2001 e 2005, ano em que unidade de igual escalão voltou àquele território, até 2017.

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Depois de em 2015 o Exército Português, pela primeira vez, ter empenhado uma unidade na Lituânia, a Recce Coy (na foto) e em 2016 uma Bataria de Artilharia, este ano de 2017 coube a vez à 1ª Companhia de Atiradores Mecanizada de Rodas, do 2.º Batalhão de Infantaria Mecanizado, do Regimento de Infantaria Nº 14, em Viseu, no âmbito das Assurance Measures, da Aliança Atlântica.

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A Artilharia do Exército Português também já cumpriu, em 2016, uma missão na Lituânia no âmbito das Assurance Measures da NATO.

No âmbito da coligação internacional que combate o “estado islâmico” no Iraque mantemos 30 militares neste país. Vários outros países aliados têm vindo a aumentar o seu empenhamento, o que não foi seguido por Portugal.

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Militar português da Brigada Mecanizada no Building Partner Capability (centro de formação) de Besmaya, Iraque, no âmbito da Coligação Internacional liderada pleos EUA que combate o “estado islâmico”, Combined Joint Task Force – Operation Inherent Resolve.

A Força Aérea cumpriu uma missão expedicionária na Roménia no âmbito da NATO com 70 militares e 4 F-16 durante dois meses; terminou a missão no Mali no âmbito da ONU com 60 elementos (e 6 do Exército) do Destacamento C-130 que ali permaneceu 6 meses. No âmbito da NATO e da União Europeia os P-3C Cup+ realizaram várias missões no Mediterrâneo quer voando a partir da sua base em Beja, quer a partir de Sigonella, Itália. Um P-3C Cup+ participou também em S. Tomé e Príncipe num exercício multinacional organizado pelos EUA. Os C-295M voando a partir de Málaga, Espanha, também participaram em operações no âmbito da União Europeia. Um C-130 efectuou uma missão de recolha de 72 portugueses afectados pelo furacão Irma, nas Caraíbas (Guadalupe) e foi também um C-130 que procedeu à evacuação para Portugal do militar Comando ferido na RCA.

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F-16 portugueses actuaram este ano durante dois meses a partir da Roménia no âmbito da operação “Falcon Defence 17” da NATO. Antes já tinham actuado na Lituânia por mais do que uma vez e na Islândia.

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Em Bamako, capital do Mali, a “base” do C-130 português que ali actuou no âmbito da MINUSMA, durante 6 meses. A decisão sobre a modernização dos C-130 continua a arrastar-se e as limitações operacionais permanecem. (Foto Força Aérea Portuguesa)

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O Destacamento Aéreo da Força Aérea no Mali  incluia militares de “protecção da força” procedimento já usado no Afeganistão em anos anteriores. [11]

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Os EADS C-295M da Esquadra 502 Elefantes que está localizada na Base Aérea n.º 6 no Montijo, também cumpriram várias missões no Mediterrâneo em 2017.

A Marinha neste ano de 2017 empenhou meios navais em operações no Mediterrâneo, cada unidade em períodos de tempo entre 1 e 2 meses – NRP Vasco da Gama, NRP Arpão, NRP Viana do Castelo, NRP Tejo e NRP Douro; e na Costa Ocidental de África – S. Tomé e Príncipe, Golfo da Guiné, num exercício multinacional liderado pelos EUA com o NRP Álvares Cabral ou missões de Cooperação Técnico Militar com o NRP D. Carlos I, Navio-Hidrográfico. Muitas destas missões envolveram pequenos destacamentos de fuzileiros e de mergulhadores. A África Ocidental aliás é uma área em que a Marinha em 2018 irá prestar bastante atenção, nomeadamente na Cooperação com S. Tomé e Príncipe.

O NRP D. Francisco de Almeida esteve 4 meses em missão na  força naval permanente da NATO (SNMG1), tendo operado do Golfo da Finlândia, no Mar Báltico ao Mar Mediterrâneo Central, passando pelo Mar do Norte e pelo Atlântico, em operações navais lado a lado com os parceiros da NATO.

Um vice-almirante português iniciou o comando operacional da EUROMARFOR que terá a duração de dois anos.

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O NRP Arpão, um dos dois submarinos da Classe Tridente da Marinha Portuguesa (Foto Marinha Portuguesa)

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A Marinha empenhou este ano um Navio Hidrográfico, o D. Carlos I, na Costa Ocidental de África em missões no âmbito da CPLP (na imagem o NRP Almirante Gago Coutinho em exercícios com mergulhadores na costa portuguesa).

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O NRP Viana do Castelo em Maio de 2011 na doca 3 da Base Naval de Lisboa, no Alfeite, frente à fragata NRP D. Francisco de Almeida. Ambas as unidades navais cumpriram missões este ano de 2017.

A Polícia Marítima cumpriu missões de apoio a refugiados no Mediterrâneo no âmbito da União Europeia, com efectivos muito reduzidos, salvando no entanto centenas de náufragos.

A Cooperação Técnico-Militar com os países lusófonos continuou este ano sem grandes sobressaltos mas também sem alterações significativas, prevendo-se finalmente para 2018 novos empenhamentos em África, nomeadamente a nível da Marinha.

As Forças Armadas continuam a participar com normalidade e na medida das nossas possibilidades nos exercícios da NATO, com forças navais, terrestres e aéreas, quer em Portugal quer no estrangeiro.

O nosso país parece ter abandonado a pretensão de instalar em território nacional um dos Centros de Excelência NATO, um que seja. Neste momento há 24 em França, Alemanha, Holanda, Polónia, Noruega, EUA, Estónia, Espanha, Eslováquia, Bulgária, Turquia, Lituânia, Roménia, República Checa, Hungria, Itália, Eslovénia, Bélgica, Letónia.

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Exercicio NATO em Portugal, forças dos três ramos realizam anualmente exercicios multinacionais em território nacional.

O Joint Analysis and Lessons Learned Centre [17] (em Monsanto) é o único comando NATO em Portugal e estão a decorrer trabalhos para receber em Oeiras a NATO Communications and Information Systems School que não tendo a mesma relevância na hierarquia da Aliança será uma instituição importante para Portugal.

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Desde 2002 que o JALLC está localizado em Monsanto, junto do Comando Aéreo da Força Aérea Portuguesa.

Durante 2017 um militar português foi morto no Mali (EUTM Mali) [19] vítima de ataque terrorista e um outro ferido na RCA (MINUSCA) no decurso de uma operação.

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A participação das Forças Armadas em apoio da Protecção Civil atingiu em 2017 efectivos e meios nunca colocados no terreno em anos anteriores.

Missões diárias em Portugal

Todos os dias os três ramos das Forças Armadas cumprem missões reais ou de treino em território nacional que merecem ser relatadas. Esta é uma realidade a que só estando atento aos comunicados oficiais do EMGFA e dos Ramos – sobretudo da Marinha e Força Aérea pela natureza das suas missões – se tem conhecimento. Não que sejam pouco importantes, ao contrário, muitas salvam mesmo vidas, quer no mar quer em terra quer no transporte de órgãos ou resgate de pessoas em situações difíceis, seja no mar alto a muitas milhas da costa, no continente e ilhas, seja no transporte de doentes nos arquipélagos. A realidade é que são tão frequentes que a comunicação social não lhes presta atenção…a não ser que haja algum drama humano de grande relevo, por outras palavras, se houver mortos ou complicações com as missões, passam a ser notícia. Mesmo sem ser em situações de catástrofe como este ano assistimos em Portugal, são largas centenas de homens/ano, todos os anos, todos os dias do ano, empenhados em missões de salvaguarda da vida humana no mar e em terra operando meios aéreos e navais.

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Os EH 101 também são empregues em missões tácticas (na foto) mas são o meio por excelência para a Busca e Salvamento no Mar (e em terra), com dezenas e dezenas de vidas salvas todos os anos.

O Exército fruto dos acontecimentos deste 2017 deverá receber mais equipamento e pessoal para o Regimento de Apoio Militar de Emergência, unidade que tendo sido oficialmente criada em 2016 já tinha na realidade uns anos de “gestação” uma vez que o Núcleo Preparatório do Regimento de Apoio Militar de Emergência estava em Abrantes desde 2013.

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Canadair de matrícula espanhola ao serviço da Autoridade Nacional de Proteção Civil portuguesa, fotografado em Julho de 2016. Vários destes aviões estrangeiros estiveram em Portugal este ano de 2017 a combater incêndios. Mesmo sabendo-se que é o avião mais adequado para esta finalidade, a opção política parece ser adaptar um futuro avião militar de transporte táctico (o KC-390) para cumprir as duas tarefas, sendo ainda uma incógnita essa possibilidade.

Este ano de 2017 os três ramos das Forças Armadas empenharam efectivos e meios em número muito superior ao habitual no âmbito dos terríveis incêndios que assolaram o país com especial incidência para Junho e Outubro. Para se ter uma noção do volume deste empenhamento note-se que só o Exército envolveu mais de 14.000 militares, o que significaria se todos tivessem sido empregues ao mesmo tempo…a totalidade do seu efectivo. 

Decorrente destes factos pareceu mesmo – na altura pelo menos, o futuro dirá qual a evolução – que os dramas vividos e a prontidão e valia do apoio militar às populações e aos que directamente combateram os fogos, mas também depois, na vigilância terrestre e aérea, no transporte de bens, alimentos e rações, levará a alterações profundas no empenhamento militar futuro. A resistência de alguns dos agentes de protecção civil ao emprego militar parecem ter sido vencidas pela realidade, resta agora ver como e se de facto se vai assistir a uma mudança radical nesta área, quer em terra quer no ar!

Comunicação

Pela natureza da actividade do Operacional – dar informação sobre a Defesa, Forças Armadas e Forças e Serviços de Segurança – somos sensíveis e atentos à questão da comunicação. Além das televisões que chegam naturalmente a milhões de portugueses, na imprensa escrita e nas rádios houve durante este ano vários trabalhos sobre as actividades dos três ramos das Forças Armadas com muito interesse. Aqui no Operacional não temos naturalmente um “serviço de informação pública” para monitorizar tudo o que é publicado, muita coisa certamente nos escapa, mas podemos dizer sem grande margem de erro que o Expresso, Diário de Noticias, Jornal de Noticias, Observador e Rádio Renascença, serão os OCS que mais atenção prestam à temática militar e que regularmente abordam temas militares que não apenas os ligados a escândalos ou desgraças, porque esses todos tratam.  

O Site da Marinha Portuguesa [23]

Em linhas gerais podemos dizer que este ano destacou-se a Marinha como o ramo mais activo nesta área, comunicando bem e muito! Só para dar um exemplo, é o único ramo que hoje (03JAN2018), já publicou na sua Revista da Armada um resumo alargado das actividades do ramo em 2017 para quem quiser, na internet, consultar. Durante 2017 foram muitas as ocasiões em que a Marinha ocupou espaço mediático na comunicação social com os mais variados temas, não é por acaso, há ali “trabalho de casa” e até a entrada de um casal de golfinhos na baía da Base Naval de Lisboa, no Alfeite, foi notícia que passou nas televisões!

O site do Exército Português [24]

O Exército teve que lidar com o assalto aos Paióis de Tancos, naturalmente um tema de muito difícil tratamento mediático. Curiosamente ao contrário de um outro caso muito difícil em 2016 – a morte dos instruendos do Curso de Comandos – que o ramo conseguiu tratar do ponto de vista da comunicação com grande desembaraço, neste de Tancos as coisas correram muito mal [25] e nem o próprio Chefe de Estado-Maior do Exército e até o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, foram poupados. As intervenções públicas do ministro da defesa que não assumiu de facto qualquer responsabilidade política, complicou em várias ocasiões o panorama mediático relativo a este caso.

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Umas das raras reportagens alargadas sobre as missões expedicionária foi para o ar na TVI e deu uma imagem muito completa da situação na RCA e do ambiente em que os nossos militares actuam.

Este caso de certa maneira desviou as atenções para a participação do ramo na missão da RCA, a qual apesar de tudo teve e tem “boa imprensa”. Primeiro porque o poder político assim o originou com visitas de alto nível à força de Comandos, Presidente da República e Primeiro-Ministro, cá, e depois já na RCA o Primeiro-Ministro novamente; depois porque a força teve e está a ter um distinto comportamento operacional e, mesmo longe e sem jornalistas portugueses em permanência no terreno, as notícias acabam por chegar. De destacar uma grande reportagem da TVI em Setembro de 2017 que cobriu muito bem a missão naquela altura. Também este ano uma reportagem da RTP sobre a “recruta” no Exército foi um trabalho bem conseguido e com impacto muito positivo na imagem do Exército.

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A FAP divulgou já no inicio deste ano um resumo da sua actividade operacional.

A Força Aérea mantém um perfil algo discreto mas conseguindo algumas boas reportagens televisivas e alimenta o seu site (e os OCS) com abundantes notícias – fotos e filmes – das suas muitas missões de salvaguarda da vida humana, no Continente e Arquipélagos. A natureza da sua actividade ajuda é certo – a aviação entusiasma multidões, basta ver os “dias de base aberta” – mas a abertura do ramo à comunicação social e mesmo em áreas que não a aviação (como um programa na SIC em que os especialistas em explosivos da FAP actuaram), acabam por “jogar a favor do ramo”.

O site do EMGFA [29]

O EMGFA tem a seu cargo em termos de informação pública as missões no estrangeiro e portanto as notícias que são publicadas e que não são muitas, diga-se, são em princípio resultado do seu trabalho de bastidores. Não será fácil despertar o interesse da comunicação social para algumas delas, e ainda pior se o EMGFA não estiver disposto a apoiar o deslocamento de jornalistas portugueses aos teatros de operações, prática aliás comum em muitos países aliados. Certamente devido a orientações do CEMGFA algumas destas missões praticamente nem são divulgadas – como a missão no Iraque acerca da qual há uma espécie de “black-out” informativo em Portugal, só sendo notícia quando o CEMGFA ou o MDN a visitam. 

O site autónomo, tipo blog, do Ministério da Defesa Nacional [30]

O Ministério da Defesa Nacional tem a sua comunicação centrada na agenda do ministro e pouco passa disso. Não havendo em Portugal uma “comunicação da defesa e forças armadas” centralizada – até os sites são todos diferentes – cada um faz a “sua comunicação” e aqueles aspectos de carácter geral que deveriam ser oportunamente divulgados, acabam por nem existir no espaço público. O gabinete do ministro da defesa fornece informação a jornalistas directamente, caso a caso, a pedido destes ou por iniciativa própria e assim se faz a comunicação. Não há como em outros países, por exemplo um site da defesa onde se consultem os programas de armamento, estudos sobre organização presente e futura das forças armadas, os textos das audições parlamentares relevantes para a defesa nacional, os efectivos militares, etc. O que há são informações avulsas que vão saindo para o público aparentemente ao sabor do momento político ou mediático. Mesmo o único documento público digno desse nome que o MDN produz, o Anuário Estatístico da Defesa Nacional [31] – e que é de facto uma muito útil ferramenta para quem se interessa pela temática militar – apenas serve neste momento para fins históricos(**), uma vez que está com dois anos de atraso. E de há muito que é assim, não se trata de uma novidade mas ninguém consegue – ou ninguém quer? –  melhorar isto, ano após ano! Se Marinha e Força Aérea divulgam logo no inicio de um ano as suas actividades do ano anterior, porque não será o MDN capaz de fazer os mesmo em relação ao conjunto da Defesa e Forças Armadas?

Por último a personalidade do actual ministro da defesa nacional que como é público tem sido bastante produtivo em afirmações polémicas e por vezes mesmo absolutamente extraordinárias, dificulta e muito uma comunicação credível para o ministério.  

A página do Ministério da Defesa Nacional no site do governo [32].

Concluindo

Em 2017 as Forças Armadas Portuguesas continuaram a cumprir as missões atribuídas pelo poder político com elevado sentido do dever, competência e espírito de sacrifício. Muitas vezes foi mesmo este último aspecto que relevou e contrariou algumas das limitações em pessoal e material que as atingem. Mas claro que não há espírito de sacrifício que consiga substituir espingardas ou blindados, navios ou aeronaves!

O que aconteceu nos Paióis Nacionais de Tancos cobriu de vergonha o Exército em particular e atingiu mesmo negativamente o topo da hierarquia das Forças Armadas. Exceptuando a acção do Presidente da República as intervenções públicas dos dirigentes políticos e militares ao longo deste processo só agravaram a situação de facto verificada. O assunto continua em investigação embora, felizmente, com parte substancial do material roubado devolvido ao Exército. Este assalto teve reflexos negativos na imagem pública da instituição militar que vão demorar a passar.

Ao contrário, a participação da Força Nacional Destacada na República Centro Africana, maioritariamente composta por Comandos deste mesmo Exército – e com outros militares do ramo e um destacamento da Força Aérea – tem sido considerada por todos os observadores de elevada proficiência, e os dois contingentes já destacados têm colocado o nome de Portugal ao mais alto nível. Têm de facto contribuído para salvar muitas vidas e ajudar a normalizar a vida em vários pontos deste martirizado país. Têm sido um exemplo, mesmo para a Força Multinacional onde está integrada, mas manda no entanto o bom-senso que não nos iludamos. A RCA é um território mais de 6 vezes maior que Portugal, a MINUSCA tem cerca de 10.000 militares oriundos na sua maioria esmagadora de países africanos, asiáticos e sul-americanos, Portugal é o único país europeu que participa com uma força de combate, mas…é apenas uma companhia. O governo português deverá avaliar bem se o esforço e sacrifício dos nossos militares tem contrapartidas no plano político, diplomático e mesmo económico. Caso contrário…

Outro exemplo que dignificou as Forças Armadas, o esforço dos militares da Marinha, Exército e Força Aérea no apoio à Protecção Civil, com as populações afectadas e os seus representantes a pedir directamente ao poder político para empenhar mais militares em seu apoio. Não sendo nem devendo ser a missão primária, não haja essa tentação, a organização militar tem muitas capacidades que podem e devem sem empregues o mais cedo possível em caso de catástrofe, sem restrições de carácter “político-corporativo” que só prejudicam as populações afectadas.

O emprego operacional no estrangeiro e o comportamento dos militares portugueses – destacamos acima algumas missões, mas ele na realidade teve lugar na Colombia, Mali, RCA, Somália, Mediterrâneo, Kosovo, Roménia, Lituânia, Iraque, Afeganistão – não é obra do acaso nem de geração espontânea! Poderá ter alguma justificação na nossa maneira de ser, portugueses, mas tem sobretudo muito de formação e treino. Ninguém nasce ensinado e se abrandar o esforço nestas duas áreas, a capacidade operacional vai ser afectada, ninguém duvide.

O orçamento da Defesa Nacional  é um dos factores que mais importância tem na situação actual das Forças Armadas. Portugal continua a gastar em Defesa cerca de 1% do PIB, muito longe portanto dos 2% aconselhados pela NATO. Sem dinheiro é muito difícil fazer mais e melhor pela segurança dos portugueses, seja em Portugal seja nas missões expedicionárias que pretendem manter o “inimigo” longe das nossas fronteiras físicas.

Em 2017 a capacidade operacional das Forças Armadas não melhorou, logo a defesa e segurança dos portugueses naquilo que aos militares compete fazer, não evoluiu, nem os efectivos actuais permitem pensar em algo diferente. Veremos nesta área o que 2018 nos reserva, há medidas anunciadas como já as houve no passado. Têm sido divulgados nos últimos anos vários concursos para novos sistemas de armas, navais, terrestres e aéreos e a modernização de navios e aeronaves. Veremos na realidade que equipamentos vão mesmo chegar aos utilizadores e se os nossos militares, quer na defesa e vigilância do território nacional, quer nas missões exteriores de maior risco vão efectivamente dispor de melhores condições para cumprirem as missões atribuídas com sucesso e segurança.

Só podemos fazer votos para que sim!

 (*) A Marinha recebeu em 2017 e um pequeno navio patrulha adquirido na Dinamarca, o NRP Douro; em 2018 está previsto receber dois NPO Classe Viana do Castelo.

Para o Exército a grande dúvida reside em saber se 2018 será o ano em que as anualmente anunciadas viaturas blindadas 4×4 e a nova espingarda serão de facto distribuídas?

Este ano foi concluída a venda de 12 F-16 da FAP à Roménia, sendo um bom e prestigiante negócio…significou naturalmente uma diminuição substancial das capacidades da nossa Força Aérea, a mesma que continua com os C-130 sem serem modernizados, logo incapazes de cumprir algumas missões. Os ALIII estão em fim de vida, assim como os Alpha-Jet, para os helicópteros, diz-se, haverá em breve substituto. Será em 2018?

(**) Agora nem isso, apenas estão disponíveis dois Anuários, 2014 e 2015, os anteriores (de 2003 a 2013) não estão disponíveis, desapareceram (confirmado no site do governo a última vez em 03JAN2018).

(***) Por motivos ligados à justiça 6 militares foram retirados da FND em preparação. A opção do Exército [33] podia ter sido enviar outros tantos militares dos Comandos que não tivessem seguido o período de preparação, mas dada a natureza e exigências da missão optou por manter a força no terreno mais um mês e fazer esses novos nomeados seguir um perído de preparação durante cerca de 5 semanas.

Nota: certamente notará o leitor que não nos referimos neste balanço a aspectos de natureza “sócio-profissional”, mesmo sabendo da sua enorme importância no contexto da Defesa Nacional e Forças Armadas. Tem sido esta a regra no Operacional nas abordagens sobre a instituição militar. A razão é simples, se por um lado achamos já haver disponível no meio mediático onde nos inserimos vários actores que se ocupam dessa matéria, por outro a fronteira entre essa temática e a política partidária é tão ténue que não queremos ir por aí. O Operacional não é uma associação nem uma empresa e muito menos uma correia de transmissão de ninguém, é mesmo uma entidade 100% privada e independente, apenas condicionada pelas idiossincrasias dos seus fundadores, com as nossas virtudes e defeitos.