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AO RITMO DO GUIA

O curso de pára-quedismo militar português tem finalmente uma história detalhada, escrita em livro, um diário, do primeiro dia da “adaptação” até ao último salto em pára-quedas do curso e à imposição da “boina verde”. Ao RITMO DO GUIA conta-nos dia após dia o que foi o 123.º Curso, manuscrito à data em que decorreu, 1985, e sem dúvida que vem preencher uma lacuna na memória histórica das Tropas Pára-quedistas Portuguesas.

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Nota prévia

Para apresentar este livro, impõem-se, especialmente para os nossos leitores que não foram pára-quedistas, uma explicação prévia. O curso de pára-quedismo militar português, ministrado em Tancos desde 1957 mas sobretudo depois de 1959, foi muito inspirado no modelo brasileiro mas também teve algo do francês e ainda do espanhol, onde um primeiro grande contingente de militares portugueses frequentaram, em 1955, o curso de pára-quedismo militar da Força Aérea de Espanha. Desde esses tempos dos “Pioneiros”, como respeitosamente todos os outros se referem aos primeiros pára-quedistas portugueses, até hoje, a “Casa-Mãe” das Tropas Pára-quedistas Portuguesas já formou mais de 45.000 “boinas verdes”. Primeiro no Batalhão de Caçadores Pára-quedistas, depois Regimento, a que se seguiu a Base Escola de Tropas Pára-quedistas, tudo unidades da Força Aérea Portuguesa até 1993 e depois, no Exército, a Escola de Tropas Aerotransportada e a actual Escola de Tropas Pára-quedistas. Apesar dos anos e de todas as vicissitudes porque passaram as tropas pára-quedistas, a guerra em África, o período revolucionário em Portugal e a reconstrução de um Corpo de Tropas Pára-quedistas, a transferência de ramo com muitas alterações organizacionais e de cultura institucional, as missões de apoio à paz um pouco por todo o mundo, a dispersão territorial das unidades dos dias de hoje e uma enorme rotação dos quadros permanentes antes colocados “toda a vida” nos pára-quedistas, a tudo isto, o curso de pára-quedismo sobreviveu e, imagine-se, muito pouco mudou na sua organização. Se juntarmos um pára-quedista dos anos 60 com um de hoje, ambos sabem o que o outro quer dizer quando falam do seu curso de pára-quedismo!

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AO RITMO DO GUIA

O livro tem uma organização muito simples, é um diário, com trinta dias úteis de instrução, a qual se iniciou no primeiro dia da adaptação(1) ao 1.º curso de pára-quedismo de 1985, o 123.º ministrado em Tancos – a unidade nesta data designava-se Base Escola de Tropas Pára-quedistas – o qual foi frequentado pelos alunos do Curso Geral de Milicianos 2/84(2), alguns soldados e ainda por seis oficiais de infantaria oriundos do Exército que desejavam integrar o Corpo de Tropas Pára-quedista da Força Aérea Portuguesa(3). Destes, três são os autores deste singular diário, Anacleto Santos, Cardoso Perestrelo e Santos Correia, alferes de infantaria que sonhavam vir a ser pára-quedistas e, além disso, tiveram a feliz ideia de passar a escrito esse caminho, experiência que hoje temos oportunidade de ler.

Antes de tudo o mais o livro lê-se muito bem, a velocidade e o ritmo da instrução – a tal cadência que os instrutores e monitores cumprem e incentivam os alunos a acompanhar – passou na realidade para as suas páginas e quase que somos levados a ler em acelerado, em passo de corrida!

Pelo detalhe que tem mas não sendo maçador – cada dia ocupa as páginas de texto estritamente necessárias (uns dias, a maioria, um par delas, outros um pouco mais), não há conversa para encher nem linguagem floreada – os autores conseguem que especialmente quem foi pára-quedista, faça uma viagem no tempo, recorde aquilo que tinha esquecido mas que de repente, afinal, estava ali num recanto adormecido da memória apenas à espera de ser lembrado. O nome das instruções, as observações dos instrutores e monitores, a sequência dos rituais, os locais, as ordens, os desabafos, a letra dos cânticos, os temores desta ou daquela instrução, os músculos que nos doíam, as características dos instrutores e monitores, tudo isso e muito mais, pela leitura, está de novo presente.

Quem o lê, como nós, passados tantos anos depois de também o termos feito – 35 – é com um misto de saudade e orgulho que nos damos conta daquilo que fomos capazes de fazer. O passar dos anos apaga algumas memórias e este livro também é uma excelente recordatória do que a vontade consegue. O curso de pára-quedismo é realmente para um jovem de vinte anos um desafio tremendo que só muito querer, enorme espírito de sacrifício e um acreditar consciente nos instrutores, conseguem fazer ultrapassar. Nem é preciso ser atleta, alguns destes ali têm falhado, mas o ritmo e intensidade que o curso atinge, é de facto algo que está muito presente nas descrições – recordamos que os autores escreviam isto todos os dias, “a quente” – que vão ao ponto de referir quantas repetições fizeram deste ou daquele exercício, quantas horas demorou esta ou aquela instrução.

Claro que cada curso é um curso e este teve algumas particularidades (não têm todos?), parte delas nem sempre agradáveis e às quais os autores não fogem. É na realidade um diário e mesmo admitindo que possa ter sido omitido algum pormenor, este curso de pára-quedismo, apesar do número invulgarmente grande de oficiais da Academia que o frequentaram, foi afinal um curso como os demais e essa é uma das virtuosidades do livro. É um guia do que foi, é, e certamente será por mais alguns anos, o curso de pára-quedismo militar português. Nada é eterno e um dia mudará, mas aqui fica o retrato de uma época que percorre já algumas décadas.

A opção de incluir muitas fotos que não só deste 123.º curso tem algumas vantagens, a saber: torna a leitura mais agradável, faz os que foram pára-quedista rever também pela imagem aquilo que são as diferentes actividades do curso; e para quem não foi, ilustra exercícios, instruções e aparelhos que de outro modo poderiam passar indecifráveis. Muito bem ainda a opção de as publicar, todas, antigas e menos antigas, em sépia, transportando-nos quase que involuntariamente para o passado. Este vector do livro só foi possível, em grande medida, graças ao extraordinário arquivo fotográfico sobre as Tropas Pára-quedistas do Alfredo Serrano Rosa.

Os cursos de pára-quedismo começaram em Tancos quase há 60 anos e este livro esteve, por opção dos autores, 30 anos “na gaveta”! A História das Tropas Pára-quedistas Portuguesas é, felizmente, um assunto em permanente actualização mas ao mesmo tempo carece do preenchimento de lacunas. Alguns livros já tinham falado pontualmente do curso de pára-quedismo, ou do ponto de vista técnico(4) ou com memórias de alguns episódios, momentos marcantes para os seus autores. AO RITMO DO GUIA é muito mais do que isso, é, a partir de agora, com rigor histórico mas também alguma emoção, a obra de referência para quem queira saber o que é um curso de pára-quedismo militar português.

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O livro tem uma ou outra “gralha” que certamente será corrigida numa próxima segunda edição, é de boa qualidade gráfica e tem um design muito agradável, com alguns pormenores muito cuidados. Para quem não foi pára-quedista, talvez se justificasse uma ou outra explicação sobre alguns aspectos, embora muitas dúvidas sejam esclarecidas pelas fotografias/legendas.

AO RITMO DO GUIA é uma edição do Pára-Clube Nacional os Boinas Verdes e o resultado das vendas reverte para esta associação sem fins lucrativos. Nas páginas que apresentamos abaixo são ainda patentes as entidades que contribuíram para a execução da obra e sem o apoio das quais a sua concretização e venda ao preço actual seria muito difícil.

O livro tem formato 17x24cm, 192 páginas profusamente ilustradas, ISBN 978-989-8758-05-7,  e pode ser adquirido pelo preço de 15,00€ no Pára-Clube Nacional os Boinas Verdes:

Rua Pedro Alvares Cabral, nº 4

2260-439 Vila Nova da Barquinha

Portugal

Telefone: +351 249 711 449

Fax: +351 249 711 161

pcnbv@sapo.pt

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(1) Adaptação ao curso de pára-quedismo: período de duas semanas (10 dias úteis de instrução), nas quais os militares que irão frequentar o curso já executam, nas duas primeiras horas de instrução da manhã e nas duas últimas da tarde, o treino físico militar especifico do curso de pára-quedismo, e durante o restante horário de instrução, cumprem o programa normal da formação que estão a receber. Terminada a adaptação, inicia-se o Curso de Pára-quedismo que consta de três semanas de instrução “em terra” e uma “no ar”, esta para efectuar os saltos em pára-quedas, sendo a sua duração sempre dependente da disponibilidade de meios aéreos e das condições meteorológicas.

(2) Nesta época os voluntários para as Tropas Pára-quedistas que tinham como habilitações literárias o 12.º ano (ou superior), frequentavam um curso com esta designação (CGM) que incluía a “recruta”, o “curso de combate” e o curso de pára-quedismo. No final do CGM, dos aprovados, os melhor classificados eram promovidos a “Aspirante a Oficial Miliciano Pára-quedista” e os restantes a “Segundo-Furriel Miliciano Pára-quedista”. Os que eram reprovados no CGM, podiam consoante o motivo de eliminação, pedir para frequentar o curso de pára-quedismo como Soldados. A designação “miliciano” equivale hoje, “grosso modo”, às de “Regime Voluntário” e “Regime de Contrato”.

(3) Os oficiais do Corpo de Tropas Pára-quedistas da Força Aérea Portuguesa, provinham de três origens diferentes: “Milicianos” (ver nota 2); “Serviço-Geral Pára-quedista” (sargentos pára-quedista ou oficiais milicianos pára-quedistas que em determinadas condições – uma das quais frequentar um curso na Força Aérea e/ou no Exército com a duração de 3 semestres – passavam ao Quadro Permanente da Força Aérea como oficiais da especialidade SGPQ e estavam limitados na promoção e em algumas funções); os oriundos da Academia Militar do Exército, que a seu pedido podiam, usualmente quando atingiam o posto de Alferes ou Tenente, candidatar-se a frequentar o curso de pára-quedismo militar, passando a integrar a especialidade “Pára-quedista” (PARAQ) da Força Aérea Portuguesa. Desempenhavam no Corpo de Tropas Pára-quedistas todas as funções, comandavam as unidades e um deles podia vir a alcançar o comando deste CTP e ascender a brigadeiro (hoje major-general). Por estes tempos esta era uma possibilidade remota uma vez que em todo o período em que os pára-quedistas estiveram na Força Aérea, apenas 3 coronéis pára-quedistas foram promovidos a brigadeiros quando em funções no CTP (Heitor Almendra, François Martins e Ferreira Pinto). Os oficiais PARAQ, a seu pedido, podiam regressar à Arma de origem no Exército e continuar a sua carreira, havendo muito poucos casos em que tal tenha acontecido. O mais conhecido é o do coronel Fausto Marques que acabou por alcançar a patente de general (tenente-general). A maioria dos oficiais da especialidade PARAQ, passava à reserva em coronel ou mesmo antes disso.

(4) Apenas um exemplo, o livro “Escola de Tropas Pára-quedistas, 50 anos – 1956-2006”, inclui (páginas 28 a 44), uns pequenos textos explicativos das diferentes componentes do curso de pára-quedismo militar.

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Leia também no Operacional sobre este assunto: LANÇAMENTO DO LIVRO “AO RITMO DO GUIA” [8]