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A OPINIÃO DE MILITARES NA IMPRENSA

Militares fora do activo escrevem regularmente ou ocasionalmente em órgãos de comunicação social as suas opiniões sobre temática de defesa e forças armadas. A lista felizmente é longa e antiga, uns escrevem muitas vezes outros menos, mas o que nos leva a este pequeno apontamento é a recente inclusão em mais dois jornais de colunas de opinião, semanais, escritas por militares.

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Dois militares, duas opiniões semanais nas páginas da imprensa portuguesa. Umas vezes estaremos de acordo, outras nem por isso, até podemos estar em clara oposição, mas certamente que serão um contributo para o debate sobre temática de defesa e militar em Portugal.

Carlos Chaves no jornal “Sol” assina todas as semanas “Em nome da verdade” e Carlos Martins Branco, assina uma coluna “opinião” também semanal no “Jornal Económico”. São ambos antigos oficiais de infantaria do Exército, passaram à reserva com o posto de Major-General o primeiro está actualmente na situação de Reforma, ambos estão desligados do serviço activo.

Alguns antecedentes

Actualmente talvez o mais conhecido militar nesta área de intervenção cívica seja o Tenente-Coronel Piloto-Aviador Brandão Ferreira (agora também na situação de Reforma), com grande volume de artigos, praticamente todas as semanas, publicados no Jornal “O Diabo” e ocasionalmente no “Público” ou em outros jornais e revistas. Mais militares com intervenção regular nesta área, no pós 25 de Abril de 1974, devem ser lembrados, talvez começando pelo Capitão de Mar-e-Guerra Virgílio de Carvalho (1927-2004) que chegou a ser colunista regular por exemplo do “Jornal de Noticias” e colaborou em várias outras publicações; recentemente falecido, o General Loureiro dos Santos (1936-2108), alcançou o maior destaque e prestigio neste campo, colaborou intensamente com vários jornais, do “Público” ao “Correio da Manhã” (onde manteve uma coluna regular), passando pelo “Diário de Noticias”, “Expresso” e outros. Mesmo correndo o risco de me esquecer de alguém, só para dar uma ideia que não é assim uma coisa tão invulgar como muitos podem crer, recordo ainda o Coronel Piloto Aviador Almeida Tomé, o Major-General Rodolfo Begonha, o Coronel David Martelo, o Coronel Ribeiro Soares, ou mais recentemente (*) o Coronel Nuno Pereira da Silva e o Coronel Barroca Monteiro no “Diário de Noticias” ou o Capitão-de-Fragata José Neto Simões no “Público”, como militares desligados do serviço activo que escreveram ou escrevem na imprensa ocasionalmente. Outros há com intervenção mais ligada às televisões e rádios, áreas que deixo fora do âmbito deste artigo, não por não terem relevância, têm e muita, mas por serem sobretudo comentadores de ocasião perante factos do momento e sem carácter regular estabelecido.  

Interessante mas também fora do âmbito deste artigo pelas suas características de organização, o Grupo de Reflexão Estratégica Independente composto por oficiais-generais dos vários ramos das Forças Armadas, fora da efectividade de serviço, que produzem “…estudos de caracter estratégico, económico e social sobre Portugal e a sociedade portuguesa, numa perspetiva do seu desenvolvimento, sobre a sua defesa e segurança e sobre os valores da cidadania…”. O GREI tem uma actividade regular embora não muito divulgada na imprensa. Alguns destes militares acabam por ter também intervenção ocasional na imprensa generalista com artigos de opinião, as suas próprias e não necessariamente as do Grupo, sendo talvez os mais assíduos os Almirante Melo Gomes e o Tenente-General Mário Cabrita. De salientar que Carlos Martins Branco também é associado deste GREI embora as suas opiniões no “Jornal Económico” não veiculem naturalmente o Grupo. Ainda nesta área recordar que em tempos a GNR criou um Grupo de Reflexão Estratégica que teve intervenção na imprensa generalista, “Diário de Noticias”, com artigos de opinião escritos por oficiais na situação de reserva ou reforma.  

No âmbito das Associações Socioprofissionais, também há militares fora do serviço activo que têm intervenção na imprensa, alguns até com bastante notoriedade ao longo dos anos, mas com uma intervenção “institucional”, ou seja, escrevem ou falam de acordo com as orientações das suas associações e fora do âmbito deste artigo que pretende focar-se nas opiniões pessoais de quem escreve, independentemente de serem ou não simpatizantes ou mesmo sócios de partidos ou associações.

Fora também deste artigo mas a merecer referência porque ocasionalmente acabam por ter reflexo na imprensa generalista, publicações como a “Revista Militar” ou “Anais do Clube Militar Naval”, não-oficiais mas muito ligadas à Instituição Militar, as quais são também veículos de opinião de militares quer no activo quer fora do activo. A linha editorial destas revistas apenas obedece às respectivas direcções eleitas pelos sócios.

A opinião das Forças Armadas

Um aspecto a que raramente a imprensa generalista atende e muito confunde, é que as opiniões de militares não são opiniões das Forças Armadas ou dos respectivos ramos! Quem transmite as opiniões da Instituição Militar quando é caso disso, quem fala em nome das Forças Armadas Portuguesas, da Marinha, do Exército e da Força Aérea, são naturalmente os chefes militares ou os seus porta-vozes nas respectivas funções. Acresce que um qualquer militar ao serviço que se pronuncie sobre um qualquer aspecto, do marinheiro ao almirante, do soldado ao general, desde que o esteja a fazer devidamente autorizado, é também um porta-voz.

Carlos Henrique Chaves e Carlos Martins Branco

Não pretendo fazer com este texto qualquer comparação entre as duas pessoas, apenas as refiro em conjunto pela coincidência temporal da intervenção cívica, de cidadania, que estão a desenvolver. É aliás conhecido que têm opiniões muito diferentes em relação a muitos aspectos.

Desde já nos parece que é importante e saudável haver militares desligados do serviço activo – aliás a lei assim o impõe, no activo não têm liberdade de exprimir as suas opiniões em público – que possam chegar com as suas opiniões “aos civis”, escrevendo sobre temática de defesa e militar e até com uma componente politica, seja ela de que orientação for. Não se trata aqui de opiniões técnicas sobre assuntos militares, embora elas possam aparecer, mas sim de entrar no âmbito da política de defesa e forças armadas e mesmo aqui e ali na área da intervenção externa, os negócios estrangeiros. Todos sabemos que muito, mas mesmo muito do que são as Forças Armadas, do poder político depende, logo o interesse e potencial destas intervenções.

Sendo certo que os militares desligados do serviço activo têm uma natural tendência para ficar desactualizados em alguns aspectos, sobretudo ligados à tecnologia e quiçá às doutrinas de emprego de forças ou até às “tricas internas” em que os organismos do Estado são férteis, também é certo que na “coisa militar” há aspectos imutáveis e as suas carreiras, longas, são garantia de conhecimento e, não o podemos iludir, os seus contactos de anos e anos de “tropa” são sempre fontes seguras.    

Ambos já são da geração que saiu da Academia Militar depois de terminada a Guerra do Ultramar, Carlos Henrique Chaves, Alferes em 1976 e Carlos Martins Branco em 1981. Não fazendo aqui nenhuma análise curricular profunda nem desenvolvendo sobre os diferentes cargos e comandos que desempenharam, podemos no entanto afirmar sem medo de errar que Carlos Chaves fez uma carreira onde teve oportunidade, em diversos postos e momentos, de estar muito perto do poder político, quer no Ministério da Defesa quer mesmo na Presidência do Conselho de Ministros; Carlos Branco teve uma carreira marcada pelas missões internacionais com diferentes cargos em vários países e teatros de operações, ao serviço da ONU, União Europeia e NATO.

São portanto dois oficiais com muitos anos de serviço, em lugares relevantes, e que hoje por vontade própria decidiram intervir no espaço público.

O que aqui no Operacional saudamos, até porque na área da “opinião” tentamos fugir dos aspectos de carácter marcadamente político – é uma opção nossa, pessoal – é: primeiro, que se tenham predisposto a transmitir ao público leitor as suas opiniões, muitos outros têm sempre muita opinião, mas nunca a escrevem nem “assinam por baixo”; segundo, não é de menor importância que os jornais em causa atribuam espaço a estes militares em concreto e ao tema em si – Defesa e Força Armadas. A realidade é que não escreve regularmente nos jornais quem quer, escreve quem tem credibilidade e quem os jornais querem.

Que as respectivas colunas de opinião se mantenham! Certamente que umas vezes estaremos de acordo, outras nem por isso, poderemos até estar em clara oposição. Mas estão a ser e serão certamente um contributo válido para a informação da opinião pública e quiçá para alguns decisores menos atentos.

(*) Nós próprios escrevemos, ocasionalmente, artigos de opinião no Diário de Notícias ao longo dos anos, vários também publicados aqui no Operacional.